1.11.06

A Canção dos Amantes


- poema de Brasigóis Felício

Pode ser que seja agora,
ou não será jamais. Provavelmente
está muito longe o instante
do prazer vital. Enquanto
não suceder
este supremo acontecimento
em nossas vidas flagradas,
e não explodir o milagre
nos gestos plenos e gastos,
jamais teremos
orgasmos completos.
E ao invés de Ser
profundos, como o que os olhos
vêem, uma vez libertos,
somos de câncer
ou de capricórnio.
Quando seremos
mais vastos que nós mesmos?
Esse destino trágico
de nor(destinados): amarras
do amor morto no gozo.

E para o amor fomos feitos:
por isto nascemos das mulheres
e depois disso
só houveram febres, e sentimentos.
É nosso destino
beber das tempestades.
Impotentes para o amor em nosso peito,
para o amor fomos feitos: morrer no desejo
com esse nó no peito.

E mais os ossos,
sêmens, intestinos,
medo e bazófia
e perdas e degredos
e os milhões de cadáveres
de que somos feitos.

Ah! Esta hora miraculosa.
Não foi à toa que sobrevivi
a tantos desastres.
Do mesmo modo que Pessoa,
eu fico sempre à margem
de qualquer combate.
Campeão sexual, herói
para mim mesmo sonhando,
amante insabido
de todas as mulheres do mundo,
eu venho
gritando essas palavras
como um mudo
e se de alguma força me alimento
é dessa espera
de milênios que me leva.
Mas não. Permaneço à margem
de mim mesmo, com medo
de fitar a imensa face
do meu Ser multiplicado.

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