Eu não dormi porque esqueci que horas são Não comi porque não sei se estava na hora E nem morria porque podia ser tarde demais E podia, ainda, ser cedo demais
Mas se fosse a hora eu saberia, saberia sim Se fosse a hora da vida, Deus avisaria
E por muito tempo eu fiquei sem nascer Até que, enfim, ninguém avisou e eu nasci E prova-se que: se acontece, é ciclo
Ciclo - Via do destino Mas não acredito pois ainda não chegou a hora De acreditar no destino
E a hora de começar poderia ser Poderia badalar e eu sentiria estremecer Me jogaria da cadeira fingindo cair E, ao chão, seria hora de me levantar
Então olha! Eu não vou contar uma história como se fosse mera coincidência. Então olha, e conto essa história como se fosse história. A alma de um homem é uma possibilidade que nunca poderia ter acontecido. É uma perfeição, um super-homem como diria Zaratustra. Alma aprisionada dentro de uma mortalidade particular. Uma corda bamba tremendo enquanto a vida passa por cima. Uma corda bamba que faz de tudo para equilibrar o equilibrista, ainda que o mais ágil. Porque se ele tomba, a corda morre de sentido pois deixa de ser bamba. A reza do padre no enterro seria assim: uma corda não começa, não termina, uma corda liga. Um momento, por favor, enquanto as coisas acontecem. Então tudo tende a um equilíbrio. É assim: quando o momento que pedi acabar, o tempo que virá depois se espremerá entre a eternidade e agora, para caber na existência. Assim, o que virá passsará mais rápido para compensar quando estava parado. Não vá se lamentando prematuramente. Não vá trapassear para, no fim, ter menos do que ainda não se arrependeu. E quando chegar a sua vez levante a mão bem alto para todos saberem que é você. E vá entrando na nave espacial, sem hesitar, para não ser alvo de críticas destrutivas. E para inspirar aqueles que aguardam, sentados defronte para o palco, a saber que é um caminho tão correto quanto a escolha de seguí-lo. E sobre os créditos da escolha não chegarão a questionar, pois esquecerão tão rápido quanto se deve esquecer.
O mundo desabava como se fosse pela primeira vez. O mundo acabava aos poucos, e era tudo que percebia. Como se perceber fosse uma razão que tanto procurava. Perceber era só saber, só dor, e nada mais. E como masoquista desencaminhado se aventurava em viver. Aventurava pois depois de muito tempo e de muitas vezes era um conselho que se sugeria como sol vacilante que ainda sim nasce e se cumpre. E ao se cumprir um conselho, não há dúvidas. Era melhor ter que se aventurar do que adiar a bifurcação. E era isso que sempre fazia: analisava sem aventurar-se: adiava. E não era. Então pusera o tempo a passar e o mundo caía, rápido demais. E não haveria como ter o espasmo de tudo. Porque cair é muito rápido e acelerado. E sem saber dessa qualidade das coisas de cair, não pudera. Quando apenas observava não previa o furto das coisas sem que ainda as tivesse. Foi uma bifurcação enorme, e literal. Depois se seguiram muitas outras enormes e literais, mas nunca de caminhos opostos. Enfim, otimismo.
Passei muito tempo escolhendo o toque do cespertador do celular Eu passei metade da minha vida pensando o quê antes da morte diria E a outra metade respirando que nem uma criança Eu gastei o tempo que eu tinha antes de encontrar uma pessoa procurando-a E o resto do tempo que sobrou eu estava preso num ônibus lotado que não chegava E chega uma hora em que não há mais volta Chega uma hora em que a ferida de viver cicatriza e a surpresa deixa de latejar E não há modo sequer de cometer suicídio O mundo passa a existir de uma maneira que nunca existira antes As coisas endurecem com o tempo como cimento E sabe, mesmo que nunca se drogue pode não ser careta E tudo pode ser arte, até o toque de um celular
Um segredo para se chegar aonde não for um destino é saber quando deixar o tempo te levar e quando deixar o tempo te puxar. No mar, sendo ele todo futuro, o destino é a linha do horizonte, formada de infinitos pontos no espaço. Cada um com seu próprio motivo para aderir à possibilidade. Os eventos temporais são tão inconstantes quanto ondas nesse mar... nesse marzão. E cada espuma é o sinal da fragilidade de uma escolha. A espuma anuncia que mais uma onda haverá de vir ao encontro do espasmo - surpresa, alegria e tristeza - pois o mar não acaba, mas o amor sim. Quando se procura aquela pedra para sentar-se só restou a areia. E sendo familiar demais a areia gruda na pele e, sentado no chão, o mar te acerta. Como se fosse este um acerto crítico a água dribla a existência, mas não há de se afogar porque viver é preciso. E enquanto houver água comemorando o corpo a areia grudada estará sendo levada para onde um grão se perde do outro até tornar-se em areia nenhuma, em lugar nenhum. Só se sabe, bem no fundo, que a areia existe. Mas essa água que lava é salgada e não importa se passou um só momento ou todo um dia em banho nela: quando sair do mar o peso do sal melado no corpo será sempre de tal valor. E se for tentado a lamber o sal na própria pele saberá que tem o gosto de todos arrependimentos por algo que deixou de arriscar. Quando o sol, que fora todo o motivo para se estar na praia, tocar então a linha do horizonte e aos poucos derreter-se ma água, o único consolo adimissível é o fato do sol estar a clarear uma possível margem oposta. uma praia, com certeza igualzinha a esta. O sol refletindo na água de ondas baixas naquele amanhecer será como todas as estrelas da noite reencarnado momentaneamente em cor de sol. E será um presente que não se sabe presentear, por timidez, para quem se banha naquela praia. Para o verdadeiro amor que lá está escondido e liberto, a se banhar.
Ninguém antes avisou que seria de tal forma vamos lá! Do que eu tô falando usando tantas vezes da primeira pessoa? Você, cujo pensamento já adimitiu, ainda não afirmou minha falta de profundidade (é uma esperança) Sua alma já abstraiu o possível do real e vomitou os clichês Ninguém me avisou E eu tô mesmo repetindo uma lamentação melosa E também me importo com a falta do mais Mas estava desavisado Apenas disseram assim: prever é a aventura de poder ser E prever é adiar a experiência - ah!, essa frase não está tão certa Prefixos confundidos com nomes próprios Eu não aguentaria ler até o fim Mas você o faria em minha causa? Ninguém nunca disse que seria tão assim De tal forma e de certa maneira Preciptando - o quê?
Fomos sortear na roleta para ver quem iria se render No dia de hoje uma genialidade que evitasse seria atrevimento Pior: seria não crer em algo que ainda não descobrimos, ou melhor, ainda não aconteceu Por mais que - a frase certa está a seguir - sejamos, ainda sim somos Tudo muito bonito e numa rima neoparnasiana protagonizada por figuas de linguagem transsexuais O erro todo é observar mais que participar; e não há sentido Sinta e tudo se fará: se abençoará
Quase um bingo, sorteios Um violão sem cordas, um mundo desfeito O mais difícil em ser triste é saber que tudo o que existe existe ao mesmo tempo O mais difícil em ser feliz é saber ser triste ao mesmo tempo Que é pra esquecer ainda durante o jogo quais cartas eram marcadas E retomar uma graça comum até um dia chegar a museu Antes mesma de completa a pirâmide, mas era mesmo só para uns mortos abrigar A graça sutil é o tamanho desses tijolos Somos uma ponte toda marcada de amarelinhas e ladrilhada de ladrilhos sobrepostos Para não se esquecer e para a causa do moderno: espelhos sobrepostos refletindo um peso que nenhum quer pesar: o de ser testemunha sem julgamento
Leve contigo seus documentos, são para os outros Leve uns CDs, a chave de casa - lógico Leve o mais leve que puder antes de partir E partido, tente ser você mesmo Aproxime seus pedaços e a gravidade os fará se juntar Assim deveria de ser Sejamos gratos a Volta para finalizar
Fumaça na água e fogo no céu e tudo o mais somos ainda do mesmo desfaz solitude próspera devaneio uma tribo composta humanidade demais demais